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descarbonização

Tendências futuras do sector aeronáutico

tendencias sector aeronautico
Alberto González

Alberto González Cubillo

Consultor de inovação especialista em aviação

O sector aeronáutico é um dos sectores da economia que dedica a maior percentagem do seu volume de negócios à I&D&I. Segundo os dados da Associação Europeia das Indústrias Aeroespaciais, de Segurança e de Defesa (ASD), o ramo civil deste sector, altamente industrializado, gasta 7,8 mil milhões de euros em investigação e desenvolvimento, tem um volume de negócios anual de cerca de 106,4 mil milhões de euros e tem um impacto significativo na criação de emprego: na Europa, por exemplo, suporta cerca de 362.700 empregos diretos.

Até 2038, prevê-se que a indústria contribua com 1,7 biliões de dólares para o PIB mundial.

Claramente, é também uma força motriz para produtos, processos e serviços inovadores que são inicialmente desenvolvidos para resolver os seus próprios desafios, mas que posteriormente encontram um nicho de aplicação noutros sectores. Neste sentido, foi apelidado de sector altamente inovador, sendo que a análise das suas tendências futuras pode ser de grande interesse para antecipar quais as tecnologias que dominarão o mercado nos próximos anos.

Nos últimos anos, a Comissão Europeia tem perseguido o objetivo de descarbonizar a aviação e, assim, alcançar a neutralidade climática, em conformidade com o Pacto Ecológico Europeu. Para tal, estabeleceu um conjunto de marcos a curto (2030), médio (2035) e longo prazo (2050) em várias categorias, como veículos, sistemas de propulsão, infraestruturas, operações e serviços, e combustíveis, que servirão de guia para que todos os agentes envolvidos no ecossistema de I&D&I (universidades, centros tecnológicos e indústria) possam tomar medidas para prosseguir a sustentabilidade do sector.

Os combustíveis do futuro

São múltiplas as vertentes de tendências futuras que impulsionam os atuais esforços de investigação, sendo que um dos debates mais acesos é sobre qual o combustível que se posicionará como o combustível do futuro. Entre as possibilidades está o estudo de novos combustíveis sustentáveis para instalações de propulsão, conhecidos como SAFs ou Combustíveis Sustentáveis para a Aviação. Os SAFs referem-se a combustíveis sintéticos que são produzidos de forma diferente dos combustíveis convencionais e são classificados como combustíveis drop-in, ou seja, combustíveis que não requerem uma alteração nas estruturas e subsistemas do motor para serem utilizados.

Relativamente a estes combustíveis, identifica-se o desafio de poder produzi-los em maior escala e disponibilizá-los nos aeroportos, um desafio que, se puder ser superado, permitirá que os SAFs sejam os combustíveis do futuro para descarbonizar os voos de longo alcance. Além disso, a própria definição de SAF deve ser modificada para abrir o leque do que é efetivamente considerado como tal.

Por outro lado, existe o hidrogénio. Este caso claro de combustível não drop-in exige modificações na instalação de propulsão e nos subsistemas da aeronave para poder ser utilizado. Existem duas formas para utilizar o hidrogénio na propulsão de uma aeronave: i) utilizá-lo numa turbina a gás para combustão ou ii) utilizá-lo numa célula de combustível para gerar energia elétrica, obtendo água como produto de reação e eletricidade. Ambas as opções se posicionam como uma alternativa viável para descarbonizar as deslocações de médio alcance e para ser uma solução no caso das células de combustível, à micro-mobilidade urbana através da motorização de veículos de descolagem e aterragem vertical (VTOL), com o desafio acrescido da necessidade de criar as infraestruturas necessárias à gestão do hidrogénio nos aeroportos e vertiports.

Estão também a ser desenvolvidos esforços importantes para eletrificar as aeronaves, o que significa equipá-las com motores elétricos potentes para as tornar híbridas/elétricas. Esta é considerada a opção mais adequada para descarbonizar os trajetos de curta distância.

Como se pode depreender, talvez não seja adequado dizer que uma solução prevalecerá sobre a outra, mas sim que todas elas têm o seu leque de aplicabilidade e só no momento oportuno será possível ver qual delas é a mais adequada para responder às necessidades do momento.

Otimização aerodinâmica

Para além do debate sobre os combustíveis do futuro, está a ser desenvolvida tecnologia altamente inovadora para melhorar a aerodinâmica e a relação elevação/resistência aerodinâmica (conhecida como eficiência aerodinâmica). Está a ser estudado por exemplo o desenvolvimento de arquiteturas integrais que podem ser consideradas “futuristas”, como a asa voadora, uma arquitetura em que toda a fuselagem da aeronave gera elevação. No entanto, apesar das suas grandes vantagens aerodinâmicas, esta arquitetura apresenta vários inconvenientes operacionais, tais como as elevadas acelerações verticais que os passageiros das pontas das asas sofreriam se a aeronave se inclinasse ou rodasse.

Outras melhorias aerodinâmicas estão relacionadas com a conceção da asa e das naceles para manter o fluxo laminar, evitando a transição turbulenta ou, pior ainda, o desprendimento (que aumenta substancialmente a resistência aerodinâmica), como as asas de elevado rácio de aspeto. Desta forma, os efeitos do fenómeno conhecido como vibração podem ser reduzidos.

Motores mais eficientes

Ligados à melhoria da eficiência propulsiva estão os motores turbofan com rácio de bypass ultra-elevado, ou seja, capazes de mover um fluxo secundário muito maior do que o fluxo primário, o que se traduz num aumento do impulso. Estão também a ser analisados materiais de alta resistência e baixa densidade produzidos a partir de tecnologias de fabrico aditivo, ou materiais de matriz cerâmica com revestimentos, capazes de suportar as elevadas temperaturas à saída da câmara de combustão.

Infraestruturas e navegação aérea

A tendência neste domínio centra-se na melhoria das infraestruturas aeroportuárias (tanto no lado ar como no lado terra) e na construção dos chamados vertiports, espaços de descolagem e aterragem de VTOL para o transporte urbano de mercadorias e pessoas. No horizonte, o desenvolvimento de gémeos digitais de aeroportos é visto como uma atividade que poderá ajudar grandemente a simulação de operações em terra. Além disso, estão a ser desenvolvidos novos algoritmos e sistemas com vista a uma maior capacidade de controlo do tráfego aéreo.

Instrumentos europeus de financiamento de projetos aeronáuticos

As iniciativas da Comissão Europeia no sector da aeronáutica articulam-se através de vários instrumentos de financiamento. Por um lado, existe o programa-quadro Horizonte Europa, cujo Cluster 5 (Clima, Energia e Mobilidade) inclui quatro tópicos relacionados com a aviação. Por outro lado, existem várias parcerias público-privadas (conhecidas como “JUs”), como a JU Clean Aviation, a JU SESAR 3 e a JU Clean Hydrogen, que visam promover o desenvolvimento de tecnologias disruptivas no domínio da aviação, da navegação aérea e da produção, armazenamento e transporte de hidrogénio, respetivamente.

De referir que a primeira delas (CAJU) estabelece três pilares fundamentais para esse desenvolvimento: aeronaves híbridas-elétricas, aeronaves movidas a hidrogénio e aeronaves ultra-eficientes de curto e médio alcance.

Esta parceria inclui ainda um segmento que aborda áreas transversais, mas fundamentais, como os processos de certificação (em que o envolvimento da Agência Europeia para a Segurança da Aviação (EASA) é altamente recomendável) e a procura de sinergias com os programas nacionais.

Além disso, no que respeita ao eixo temporal, podem distinguir-se duas fases: uma primeira fase, que compreende o período 2022-2025, dedicada à identificação de conceitos disruptivos com elevado potencial, e uma segunda fase, que compreende o período 2026-2031, destinada a amadurecer, integrar e demonstrar as tecnologias identificadas. Este ano, foi lançado o segundo convite à apresentação de propostas da CAJU, com data de encerramento a 11 de Maio, que visa financiar 9 projetos (dos quais 8 são ações de inovação e um é uma ação de coordenação e apoio) com um orçamento total estimado em 137,75 milhões de euros.

No caso da empresa comum SESAR 3 JU (Single European Sky ATM Research 3 JU), a prioridade é gerir a procura crescente de tráfego aéreo. Para o efeito, está previsto o lançamento de um convite à apresentação de propostas em meados deste ano.

Se é uma grande empresa, uma PME ou uma universidade/centro tecnológico e está interessado em apresentar uma proposta de projeto no domínio da aeronáutica, se tem dúvidas sobre as condições de elegibilidade ou se tem quaisquer outras questões relacionadas com estes programas, não hesite em contactar a Zabala Innovation para que o possamos ajudar na preparação da proposta ou na gestão do projeto. Além disso, junte-se à nossa rede Kaila, uma grande ferramenta de pesquisa com uma base de dados completa, para encontrar mais informações sobre as diferentes convocatórias e projetos.

 

Pessoa especialista

Alberto González
Alberto González Cubillo

Sede de Bilbau

Consultor de inovação especialista em aviação